segunda-feira, 6 de maio de 2013

Encontros e Desencontros Capitulo 08

CAP VIII – Desavenças

- Kelly, o que você está fazendo aqui? – Não consegui disfarçar minha surpresa e perguntei logo que fechei a porta da sala de entrevista.
- Por que a surpresa? Eu só lembrei-me da vaga e decidi me inscrever. – Hoje ela sorria e estava um tanto ousada.
- Sim, mas é a vaga de sua amiga, sua melhor amiga, arrisco dizer. Você não se sente mal com isso? – Eu não sei o que havia por trás e se é que havia algo, mas eu fiquei um tanto intrigado com a sua inscrição para a vaga tão cedo.
- Sim, mas essa minha amiga já está morta. Você vai fazer a entrevista?
Fiz perguntas rotineiras, seguindo o cronograma que estava na folha de papel que Claudia me entregou. Ao fim de nossa conversa, Kelly levantou-se e pude perceber como estava diferente daquela noite. Hoje usava um vestido cor nude que acentuava sua cintura e um sapato alto que dava ar à sua postura. O que estava acontecendo? Por que estava tão feliz alguns dias após a morte de sua amiga? Fiquei pensando que só eu por ali tinha sentimentos tão à flor da pele.
Na volta para a casa no fim do dia, resolvi ligar para Laura, porém, ela não me atendeu. Aquilo já estava virando rotina, aquele tratamento distante e aquela conversa curta de sempre. Por muitas vezes prometi a mim mesmo desistir dessas ligações e desse comprometimento não recíproco, porém, essa solidão por aqui me faz querer tê-la perto a cada dia mais. Essa mudança constante de humor das pessoas por aqui me faz querer conviver somente com seu jeito que conheço tão bem. Por que tão difícil? E eu que achei que já tinha passado por todas as dificuldades da vida. Só estava começando.
No outro dia pela manhã nada de anormal na clínica, Jaque estava em sua sala, como de costume, e Natty também. Como fazia todas as manhãs, fui visitá-las.
- Bom dia Natty!
- Oi Renato, bom dia. Como você está? – Ela baixou a revista logo que me viu.
- Estou bem e você?
- Estou bem também, dentro do possível. – Ela não parecia nada bem, pois logo levantou a revista sem dar importância para a minha presença.
- Ontem entrevistei uma candidata para a vaga de Deise, mas nunca fiz isso, não sei se me sinto seguro para contratar alguém assim. – Quis quebrar o gelo e puxar um assunto diferente, mas só depois percebi que havia voltado ao mesmo: a morte de Deise.
- Você vai fazer a escolha certa. Confiamos em você. – Dessa vez largou a revista na mesa de centro e levantou-se mudando de assento para o meu lado. – Sabe Renato, eu estou insegura, não me sinto mais à vontade por aqui, não sei o que está acontecendo, mas sinto que há algum mistério por trás desses últimos acontecimentos.
- Acalme-se Natty, ainda é recente, eu não devia ter tocado no assunto, vamos esquecer isso e ter um ótimo dia de trabalho, seus clientes precisam disso. – Apenas tentei acalmá-la, mas eu também sentia a mesma coisa, havia algo de muito errado por trás de tudo isso. Mas o que?
Saí de sua sala abraçando-a afetuosamente e desejando um ótimo dia de trabalho, ao meio dia eu voltaria para conversarmos mais. Encaminhei-me então para a sala de Jaque a fim de fazer o mesmo.
- Bom dia Jaque!
- Bom dia Renato. – Ela já estava em seu posto de trabalho e fixa à tela do computador.
- Tudo bem? Trabalhando já?
- Estou bem, e você? Estou sim, adiantando algumas coisas.
- Vou bem, obrigado. – Respondi sabendo que não haveria resposta alguma, então logo em seguida já tornei a falar. – Você conversou com Natty hoje? Estive ali agora a pouco, ela ainda está muito abalada, você não acha que ela deveria tirar uma semana de folga?
- Se ela merece tirar, todos nós merecemos. Ela nem era da família, Renato. É coisa de momento, eu sei. – Jaque respondeu friamente e ainda assim sem tirar os olhos do computador.
- Jaque, ela enfrentou a situação toda sozinha. Eu cheguei depois da bomba ter estourado, apenas cuidei dos últimos detalhes, mas foi Natty quem aguentou tudo isso. – Não me contive. O que é que estava acontecendo com ela? Nem parecia ser psicóloga.
- Pode ser Renato, pode ser. Agora se me dá licença, eu vou tomar um café. Tenha um bom dia. – Ela respondeu e logo saiu de sua própria sala, me deixando ali sem chances de falar tudo o que ela merecia ouvir.
Fiquei curioso com o que estava interessando tanto a ela no computador, pois não parecia assunto de trabalho. Arrisquei-me e fui até ele, abri a pagina da internet e consegui ver seus últimos acessos. Apenas páginas em que continham notícias de Deise, notícias sobre sua morte, suspeitas e detalhes daquela noite. Não entendi o seu interesse fixo naquela história que sabíamos de trás para frente. Será que ela sabia algo mais? Consegui encontrar também um acesso do dia em que ela retornou para a clínica após o acontecimento, ela pesquisou o perfil do investigador, foi o primeiro acesso ao ligar o computador naquele dia. Por que ela teria tanto interesse nele? Fechei as páginas e fui para a minha sala, pronto para um dia de trabalho tranquilo, apesar de todas as emoções logo cedo.
- Alô, Renato?
- Oi, é ele.
- Renato, é a Cláudia, tudo bem?
- Oi Cláudia, tudo certo e com você?
- Tudo certo. Olha só, como foi a entrevista ontem? Não pude falar com você depois.
Fiquei sem saber o que responder, não queria parecer ter incerteza, mas também não tinha certeza de nada. Como não pude pensar que ela iria ligar?
- Você sabe, não entendo muito bem dessas coisas, por que não deixou a parte de testes numéricos para mim? – Brinquei para descontrair e tomar outro rumo da conversa.
- Bem que eu gostaria Renato, mas você sabe, Natty e Jaque estão em pé de guerra por aí. – Ela não teve papas na língua e eu não podia imaginar que a situação estava desse jeito.
- É, mas logo tudo se ajeita. – Apenas concordei.
- Então, me diga, o que você achou do perfil? É que por incrível que pareça, foi a única candidata que apareceu, estou aguardando mais alguma, mas até agora nada. E você sabe, ela dividiu apartamento com Deise, que Deus a tenha, então deve ter praticamente as mesmas atitudes. – Percebi no seu tom que ela estava suplicando para que eu aprovasse o perfil de Kelly.
- Cláudia, não deu para tirar alguma conclusão, a moça pareceu-me simpática, tem perfil de recepcionista, só não posso afirmar com certeza se é confiável e comprometida.
- É? Vou marcar uma entrevista com ela então, estou resolvendo alguns outros casos da clínica, por isso deixamos a entrevista com você, me desculpe, essa não é a sua função.
- Imagina, conte comigo sempre que preciso. Mas passo a bola para você agora. – Respondi aliviado por não ter que ter responsabilidade daquela situação.
Desliguei o telefone e voltei ao que estava fazendo, meu estômago já indicava que o horário do almoço estava chegando, e assim lembrei de Natty e em como ela estava precisando de alguém para conversar.
- Oi Renato, já é meio dia?
- Oi Natty, sim. Muito concentrada no trabalho? – Perguntei sorrindo a fim de reconfortá-la.
- Quem dera, pensamento longe, mas a tarde tenho cliente, espero que me ajudem. Que ironia, não? – Enfim eu a vi sorrir.
- Que bom. O que você acha de almoçarmos naquele restaurante que havíamos comentado na semana passada? Vamos sair um pouco daqui. – Assim como ela, eu também estava precisando de um tempo para esquecer os problemas e não ligar para Laura.
- Ótima idéia Renato, vamos sim. – Ela pegou sua bolsa e logo saímos de sua sala.
No caminho do corredor encontramos Jaque, senti o clima esfriando na hora em que seu olhar encontrou-se com o de Natty.
- Que lindos! Vão almoçar juntos e nem me convidaram? – Ela pôs um sorriso irônico e passou ao nosso lado sem ao menos esperar a resposta.

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